Abigail Moura

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(Eugenópolis – MG, 1905 – Rio de Janeiro – RJ, 1970)

 

Abigail Moura nasceu em uma família negra da pequena cidade de Patrocínio de Muriaé, localizada no sudeste do estado de Minas Gerais, bem próximo à divisa entre Rio de Janeiro e Espírito Santo. Começou na cidade natal o interesse do menino pela música. Quando criança ele logo entrou para a bandinha local, onde aprendeu a tocar os instrumentos percussivos e mais tarde o trombone também. Porém, uma vez que a cidade mineira era muito pequena para as ambições daquele jovem apaixonado por música, Abigail mudou-se para o Estado da Guanabara, cidade do Rio de Janeiro, onde foi trabalhar como músico tocando bateria e trombone.

Durante a década de trinta, na cidade maravilhosa, Abigail se integraria aos poucos à sociedade negra local, fazendo amizade com grandes nomes da música e do samba carioca como Donga, Pixinguinha e Anacleto de Medeiros. Algumas composições do então músico popular chegaram inclusive a fazer um pouco de sucesso nos morros e no asfalto carioca. Em abril de 1942, inspirado pela voz da cantora Maria do Carmo, Abigail criou a Orquestra Afro-brasileira, grupo que lideraria por quase trinta anos, até a sua morte. A Orquestra foi formada por Moura no mesmo momento em que os amigos Abdias Nascimento e Solano Trindade formavam os primeiros grupos teatrais e de dança compostos exclusivamente por negros. Nessa época, os três amigos frequentavam o terreiro do famoso Pai de Santo Joãozinho da Goméia, em Duque de Caxias, cidade vizinha ao Rio de Janeiro, e refletiam bastante sobre a situação do negro brasileiro. A partir de 1945, a Orquestra Afro-Brasileira passou a ser formada exclusivamente por músicos negros. As apresentações do grupo, por sua vez, homenageavam os grandes nomes negros da cultura brasileira, como Teodoro Sampaio, a quem foi dedicado o vigésimo quarto concerto da orquestra, realizado em quinze de janeiro de 1949.

 Os arranjos e composições de Moura uniam os instrumentos tradicionais de percussão advindos do continente africano para o Brasil, aos instrumentos de harmonia e sopro, tradicionais das big bands de jazz dos EUA. O grupo da Orquestra era composto por cerca de vinte músicos que se dividiam entre instrumentos percussivos, como o urucungo (berimbau), agogô, gonguê e atabaques e os instrumentos de sopro, como saxofone, clarinetes e trompetes. Os cantores solistas cantavam em línguas do continente africano do tronco linguístico bantu, em língua iorubá ou na língua indígena brasileira nheengatu. Eram interpretadas toadas de maracatu, batuques, jongos, além de pontos de umbanda e candomblé. Regendo a Orquestra, Abigail gravou dois discos, Obaluayê, 1957, pela gravadora Todamérica e Orquestra Afro Brasileira, 1968, pela gravadora CBS. O grupo foi premiado pela Tv-Rádio Record de São Paulo, além de ter recebido a medalha de bronze do Instituto Benjamim Constant. Em 1968, A Orquestra foi considerada utilidade pública por uma lei Estadual fluminense.  

Abigail Moura foi pioneiro na fusão dos elementos da rítmica africana aos elementos da harmonia jazzista norte-americana, abrindo espaço para o surgimento de outros trabalhos voltados para esta mesma temática que viriam a ocorrer mais tarde, como os arranjos do famoso maestro Moacir Santos em seu álbum de estreia “Coisas” e os recentes trabalhos da Orquestra Rumpilezz, liderada por Letieres Leite.

Contam que antes de cada apresentação, Abigail performatizava como um verdadeiro sacerdote das religiões afro-brasileiras. Alguns dos músicos da Orquestra eram adeptos da religião e o palco se tornava o próprio terreiro. A trajetória do grupo é marcada por alguns fatos extraordinários. A cantora solista oficial da Orquestra, Maria do Carmo, teria enlouquecido em plena apresentação e nunca mais teria cantado. O fato ocorreu antes ainda da gravação do primeiro LP do grupo, quando a voz solista feminina foi de Iolanda Borges. Em outra ocasião, depois da intromissão de um bêbado inconveniente que atrapalhara a orquestra logo em seu primeiro acorde, Abigail teria realizado uma atividade com seus comandados e voltado ao palco novamente, dando início a apresentação com um ponto de Exu-Tranca-Rua. A partir daí, a apresentação teria seguido seu curso tranquilo e leve.

Paralelamente ao trabalho com a Orquestra, Abigail liderou também uma big band que tocava ritmos importados, além de exercer o ofício de copista (copiava documentos e partituras a mão) da rádio MEC. O maestro servia-se dos lucros destes trabalhos para manter o projeto maior da sua Orquestra. Abigail Moura faleceu em 1970, extremamente pobre. Nos últimos anos de sua vida, Moura morava no bairro Benfica, zona norte do Rio e Janeiro. Com a morte do maestro, a Orquestra Afro-Brasileira teve fim.

No início dos anos dois mil, uma parceria entre o artista plástico e curador Emanoel Araújo, então curador da Pinacoteca de São Paulo, e o dj e pesquisador Grégoire de Villanova, rendeu um excelente trabalho de pesquisa sobre a obra de Abigail e o relançamento de algumas faixas dos dois discos do grupo em um livro-CD. O lançamento do material fez parte das atividades relativas à exposição “Negras Memórias, memórias de negros”, organizada por Emanoel. Onze anos depois, em nova parceria entre os dois, foi inaugurada em 17 de novembro de 2014 a exposição “Breves Notícias: Abigail Moura e a Orquestra Afro-Brasileira”, realizada no Museu Afro Brasil. Três dias depois, em 20 de novembro 2014, dia da consciência negra, na plateia externa do Auditório do Ibirapuera, foi realizado o show de retorno da Orquestra Afro-Brasileira, liderada agora pelo músico Carlos Negreiros, que fez parte da Orquestra na década de sessenta como percussionista e solista.     



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